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Quanto mais corpos cetônicos melhor? Conheça os números reais da cetose.

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Existe uma parcela de médicos sérios que têm alertado para o frenesi do “quanto mais corpos cetônicos melhor”. De acordo. Já falei sobre a importância da cetose elevada em diversos posts e vídeos. Hoje, quero falar com a outra parcela da população, aquela que não precisa ou não consegue números elevados tão facilmente.

  • Será que você precisa elevar corpos cetônicos?
  • O que você está fazendo para elevá-los?
  • Quais os riscos que corre com estas medidas?

Vamos às questões principais:

  1. Sabemos que o BHB é um combustível no corpo humano. Quanto mais BHB, mais energia. É por isso que seu BHB é reduzido após a atividade física. Se os seus corpos cetônicos estão reduzindo, talvez, você simplesmente tenha usado como combustível: ou seja, está muito bem adaptado e é exatamente isso que queremos.
  2. Sabemos que corpos cetônicos têm efeito anorexígeno e que não comer pode ser fascinante: seja na economia com comida ou com tempo. Ainda, que corpos cetônicos são ácidos e que há sim risco de acidose metabólico quando elevados demais.
  3. Sabemos, também, que a cetose, ao menos na fase de adaptação, pode elevar neurotransmissores e hormônios como cortisol, adrenalina e noradrenalina (1), gerando efeitos similares a comportamentos classificados como “hipomania” pelo psiquiatra Chris Palmer – muito do efeito anorexígeno vem justamente da elevação das catecolaminas acima mencionadas (adrenalina e noradrenalina).

Disclaimer: este conteúdo é informativo para o público em geral com base em pesquisas científicas e não substitui avaliação com seu profissional de saúde.

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Palmer em painel sobre hipomania na fase inicial da Dieta Cetogênica. Muito conversamos sobre isso em reunião.

Estas alterações geram efeitos fantásticos mesmo, tanto que são buscados em muitas drogas e comportamentos estimulantes: muito foco, muita clareza, muita produtividade, muita energia, nenhuma fome. Isso é tão incrível, que corpos cetônicos foram eleitos a “cool drug” do ano passado. A “droga do bem” de 2019, em tradução livre.

Nem tão do bem, dependendo do que você estiver fazendo para alcançá-los. Se você foi abençoado com corpos cetônicos acima de 2,0 mmo/l apenas com uma caminhada, uma boa alimentação e bom sono, excelente. Feche este artigo e vá ser feliz.

Se este não for seu caso, por favor, leia este conteúdo.

Riscos da busca por corpos cetônicos elevados

Eu não fui abençoada com corpos cetônicos elevados de forma fácil. Raros foram. Possivelmente, para chegar a isso, terá que se exercitar mais do que o corpo sustenta, cortar mais carboidratos do que o corpo permite ou, pior ainda, manter proteínas muito baixas. Os riscos são nada menos do que perda de massa magra e massa óssea, perda de energia, desregulação hormonal, aumento de estresse, amenorreia, queda de cabelo etc.

Então, quais são os supostos números ideais?

A verdade é que os números ideais são uma resposta do seu corpo a atitudes ideais. Uma dieta cetogênica bem feita, limpa, densa, respeito ao ciclo circadiano, redução de estresse, exercício físico. Faça isso e observe seu número ideal. Ele é um resultado das suas ações.

Para nos ajudar na explicação, quero convocar o ícone da Dieta Cetogênica para síndrome metabólica, Stephen Phinney, da Virta Health. Possivelmente, o seu caso é similar àqueles com os quais Phinney trabalha: bem-estar, emagrecimento, melhoria da resistência insulínica, estabilização da glicose etc.

[Um dia, farei um post sobre a redução natural do BHB a partir de um ano de adaptação à cetose. Ainda, outro post sobre os possíveis riscos da chamada “overketosis” ou “starvation ketosis”, uma cetose acima dos níveis ótimos indicados aqui, como os 5,8 que ilustram a imagem deste post.]

Números ideais de corpos cetônicos de Stephen Phinney

Na obra The Art and Science of Low Carb Performance (2), Stephen Phinney nos ensina sobre seus números ideais:

  • Cetose nutricional leve (emagrecimento): entre 0,5 mmol/L e 1.0 mmol/L
  • Cetose ótima (benefícios cognitivos e performance física): entre 1,5 mmol/L e 3,0 mmol/L
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Gráfico extraído da obra de Stephen Phinney e Jeff Volek

 

Legal, Phinney. Agora, observemos de onde estes números saíram. Cito a fala de Jeff Volek, extraída da obra, para vocês (2):

“Conforme carboidratos são reduzidos para menos de 50g por dia e a proteína não é consumida em excesso, a maioria das pessoas produzirá corpos cetônicos acima de 0,5 mmol/l. No estudo de Steve (3), com ciclistas de competição que pedalavam de 160km a 320km por semana e que consumiram baixíssimo carboidrato (menos de 10g de carboidratos totais ao dia), em uma Dieta Cetogênica mantida por 4 semanas, eles alcançaram níveis de BHB entre 1,5 e 2,5 mmol/l. Em mulheres com sobrepeso que mantiveram uma Dieta Cetogênica de baixa caloria (4), os níveis foram os mesmos ou ainda maiores.”

Oras, isso fecha exatamente com os riscos acima propostos.

  • 320km de pedalada por semana?
  • Cetogênica, uma dieta cujo principal macronutriente é hipercalórico (gordura), de baixa caloria?

Um dia, falaremos sobre os riscos da Cetogênica hipocalórica (são sérios e por isso a Cetogênica normocalórica é a indicação padrão atualmente). O que também deve ser salientado aqui é que ambas as condições dos estudos garantem uma altíssima mobilização de gordura de forma rápida, seja o elevado exercício ou o corte de calorias. Isso obviamente nos levaria aos corpos cetônicos elevados.

Vale apontar que, observando os dois estudos, vemos que os participantes estavam na fase de TRANSIÇÃO, quando sabemos que os números são, de fato, os mais elevados (ainda mais se houver perda de peso, ainda mais se forem atletas).

Números reais de corpos cetônicos de Stephen Phinney

Vamos a um dos maiores estudos da Virta, COM DIABÉTICOS, que durou um ano inteiro (5). Neste estudo, os níveis de BHB dos participantes começaram em 0,17 e foram para 0,54 mmol/l ao longo de 10 SEMANAS DE DIETA CETOGÊNICA.

Repito: em dois meses e meio, o BHB foi de 0,17 para 0,54. Aos 12 meses, os níveis foram reduzidos para 0,3 mmol/l, sem mudanças na dieta. Neste caso, é crucial apontar que falamos de diabéticos que, obviamente, têm corpos cetônicos reduzidos pelo alto nível de insulina. Contudo, eram pacientes do maior pesquisador de cetose no mundo. Ou seja, eles não poderiam estar em melhores mãos para atingir corpos cetônicos.

Mesmo assim, tiveram picos de 0,54 ainda em uma possível fase de adaptação.

Por isso, respire fundo e fique tranquilo se você está entre o 0,54 da resistência insulínica (ou os 0,3 da pós-adaptação) e o 2,5 mmol/l dos atletas com perda de peso.

Finalizo com uma fala fundamental de Stephen Phinney: “eu discordo do comportamento adolescente competitivo que busca ver o quão alto você consegue chegar às custas do risco de perda de massa magra através da redução extrema da insulina”.

Bingo, Phinney.

Caso você de fato sinta um profundo amor pela euforia dos corpos cetônicos elevados, lembre-se: eles cairão quando a adaptação passar – a não ser que a adrenalina e o cortisol no ápice valham a pena medidas que prejudiquem o seu metabolismo.

Outros links importantes:

Quantos corpos cetônicos preciso produzir? (Como interpretar os números no medidor)

Qual o melhor horário para medir seus corpos cetônicos?

Onde compro o aparelho medidor de corpos cetônicos?

Referências:

1 Effect of low-carbohydrate-ketogenic diet on metabolic and hormonal responses to graded exercise in men (Langfort e outros – 1996)

How does a keto diet affect stress hormones? (Sarah Neidler, Ph.D)

2 The Art and Science of Low Carb Performance. Clique para baixar a obra completa

3 The human metabolic response to chronic ketosis without caloric restriction: preservation of submaximal exercise capability with reduced carbohydrate oxidation (Phinney, Volek e outros – 1983)

4 Capacity for moderate exercise in obese subjects after adaptation to a hypocaloric, ketogenic diet (Phinney e outros – 1980)

5 Effectiveness and Safety of a Novel Care Model for the Management of Type 2 Diabetes at 1 Year: An Open-Label, Non-Randomized, Controlled Study (Sarah Hallberg, Stephen Phinney, Jeff Volek e outros – 2018)