Tu já ouviu de alguém que tu gera problemas onde não existem ou que maximiza as questões até que se tornem crises?
Possivelmente, sim. Ouço isso desde que nasci e queria que tu ressignificasse isso.
Toda a base da minha psicologia está fundamentada no aniquilamento do positivo e do negativo: é o fim das polaridades a partir da complementaridade, da integralidade. Por isso trato bipolares.
É tu compreender que a ideia de positivo e de negativo é o grande algoz da tua mente e que é esta ilusão original que gera teu caos mental.
E tu cresceu gerando crises onde não havia e estes problemas foram se somando, porque as crises não vão parar de se acumular até tu entender o que elas querem te dizer. Agora, tu é de fato uma acumuladora e vive em uma casa cheia de caixas jogadas pelo canto. Cada caixa tem uma crise guardada e o caos é tão grande, que não é mais possível saber por onde começar a organizar.
Aqui, entra o psiquiatra.
Ou, entra a cura.
O que aprendi em 38 anos de criação de crises?
Que poder, o verdadeiro poder, é a capacidade de solucionar as crises.
Aquele que vive para evitar as crises encontrou o mais perfeito caminho para a estagnação.
Qual o problema em criar problemas se há amor pelo desafio de solucioná-los e as lições aprendidas na jornada te geram verdadeiro poder interno?
E eu quero te avisar que tua mente te presenteia com 700 crises diárias porque tu precisa abraçar este poder. Se tu seguir renegando este chamado, amanhã, serão 800 crises. 900 crises. E eu sei que apavora. Eu me apavoro ao menos.
Toda crise tem um movimento padrão, que é o movimento de evolução humano:
- zona de conforto
- crise
- caos
- aprendizado
- evolução
- zona de conforto.
Assim, vamos crescendo.
Quero que te dizer que o que tu teme não é perder a zona de conforto. Isso é idiotice de instagram e tua ansiedade interna exigindo que tu te mova agora é a prova do que estou dizendo. Mais idiotice ainda é a máxima “vai ficar tudo bem”, que não funciona para uma mente extraordinária.
A mente extraordinária sabe o tamanho do caos que se segue à crise. E o medo dela não é sair da zona de conforto, é enfrentar este caos gigantesco.
Porque o tamanho do caos é o tamanho do homem. O medo é a medida do homem. O tamanho do teu medo mostra o tamanho da complexidade com que tu enxerga o mundo. É por isso que assusta tanto.
E tu fica aí, te sentindo um solitário coitado, quando na realidade o medo que te toma é teu único troféu de grandeza. Tu é imenso e teu medo é imenso.
Ok, mas como vencer este medo?
Com teu maior ponto fraco: pequenas ações. Simplicidade.
São necessárias décadas de prática para que tu acredite que é capaz de vencer absolutamente todas as crises e aprender a cruzar todos os caos que obrigatoriamente seguirão cada uma das tuas ideias mirabolantes.
Como fazê-lo?
- Teu quarto está bagunçado. Arrume-o. Pronto. Tu venceu uma crise.
- Tua geladeira é um acúmulo de junk food. Jogue fora, vá ao supermercado e compre comida de verdade. Pronto. Tu venceu mais uma crise.
Tu está aí esperando que o anjo Gabriel desça do céu com uma bandeja de virtudes que te farão ser capaz de solucionar todas as crises que tu criou ao longo de décadas – todos estes chamados para abraçar teu maior poder: ser um solucionador de crises. Temo dizer que Gabriel está ocupado com outras coisas.
Então, eu venho no lugar dele dizer que é hora de levantar desta porcaria de computador, arrumar os armários, pagar as contas do mês, cozinhar, lavar a louça e sentar no fim do dia mostrando para si mesma que tu venceu as crises de hoje.
Repita isso por 30 anos. Tu cruzará divórcios, mortes, desemprego e todas as tragédias humanas com teu maior troféu: tu sabe arrumar teu quarto, organizar o armário e passar a vassoura na casa.
Por que a casa importa tanto?
- A primeira meta do ser humano é unir sua mente e suas emoções. Tornar mente e coração integrados, não conflitantes. Ideias e emoções precisam andar na mesma direção.
- A segunda meta do ser humano é pegar a integração mente/emoção e integrá-la ao corpo. Isso é ação. É isso que freia o pensamento incessante, é colocar teus valores mais profundos em prática. Estas três integrações são o oposto da dissociação que caracteriza grande parte das neuroses das quais sofremos. Mas, temos a terceira e mais árdua meta, ligada aos meus amados fenomenologistas:
- Tua terceira meta é apagar a separação entre tu e o mundo.
Este é o ideal da filosofia e é o anticristo da psicologia de instagram, este mundo da suposta autonomia, em que tu precisa vencer tudo independentemente do meio.
Esta merda de autonomia contemporânea, que na realidade é uma reatividade à nossa incapacidade de gerar laços, jamais funcionará com os leitores deste site, porque estamos condenados, fisiologicamente, à lição da fenomenologia:
Não há separação entre nós e o mundo.
E é por isso que as luzes e os sons te machucam. É por isso que tua mãe tóxica te destrói. Que o frio arrebenta com teu sistema vascular. Que a indiferença do teu marido te sabota.
“Tu é uma esponja”, falam de nós. Somos uma esponja aos estímulos externos.
Seria isso uma doença? Direi que não, porque este é o ápice do ser humano aos olhos de Jung e de diversas tradições budistas.
O apagamento entre os muros que supostamente nos separam é o mais alto grau de desenvolvimento da psique humana. É a verdade da interdependência.
E é exatamente por isso que a tua rotina está um caos neste momento. Porque tu está um caos e o mundo está um caos pandêmico.
Agora, me diga, o que é mais fácil: tu organizar tua psique, encontrar a cura da covid ou passar uma vassoura na sala e ir ao banco resolver a burocracia de hoje?
Não há diferença entre teu lar e tua mente. Aprender a organizar o externo é aprender a organizar o interno. Cruzar o caos inicial de uma faxina e sorrir cheia de dores no corpo ao final do dia é exatamente o mesmo movimento que tu percorrerá ao longo de toda tua vida. Para absolutamente todos os desafios.
Comece pequeno, mas nem por um segundo esqueça: este pequeno passo tem um poder imensurável sobre tua história.
É tudo imenso para ti, não é mesmo? Então, pague o preço desta verdade integralmente. Vá varrer a sala enquanto salva o mundo.
Ju, que maravilha seus textos. Tudo faz muito sentido pra mim quando vc fala e me acalma. Reconhecer que toda essa desordem criada e alimentada está apenas querendo conversar contigo e te ensinar algo. E nós fugindo. Eu ja vinha analisando isso, a bagunça que tenho deixado virar meu guarda roupa, o prazer que perdi em arrumar minha casa e o tempo que deixei de estar com meus filhos no sofá assistindo qualquer coisa com eles. Tudo isso foi ficando pra tras e hoje fico exatamente em frente ao computador buscando, procurando explicações de porque isso aconteceu e como faço pra recuperar tudo isso. E você não poderia ter deixado a explicação mais simples…voltar a fazer as coisas reais, um pouquinho por dia, um dia de cada vez. Voltr, devagar, exatamente como fui deixando…
Rita, nós duas somos a prova da infinitude de caminhos que a vida dá. Começamos de mãos dadas, a vida nos separou um pouco, mantivemos os laços de outra forma. Eu sigo aqui, tu segue aí. E eu sigo observando tuas cascatas.
As cascatas externas, que se manifestam nos depoimentos confusos que tanto vemos no nosso grupo, são as cascatas de desordens internas. Novamente, qual cascata é mais fácil de consertar? Cada ser tem uma forma de se reorganizar. Todos estão certos – errado apenas aquele que acredita que só existe um caminho.